sábado, 28 de março de 2015

Recordar o Engº Vaz Pinto

Um Homen Honesto, que saudades e que falta faz a Portugal !...

O CENTENÁRIO 
1905 - 2005

O nosso pai foi ao longo da vida um homem honrado que marcou profundamente as pessoas, através das acções que desenvolveu e dos acontecimentos em que participou – um exemplo de cidadania.
A sua educação esmerada, o amor à família e uma força moral inabalável, aliadas à sua inteligência, curiosidade e capacidade para aprender, produziram uma marca de honestidade que permanece em tudo o que fez.
EDUCAÇÃO 
Os nossos Avós deram uma educação esmerada aos seus filhos, fazendo todos os sacrifícios para lhes dar oportunidades para a vida – lembremos que o nosso avô Alfredo (Bisavô dos nossos filhos), uma vez ao ser abordado na rua com a pergunta: então Sr. Vaz Pinto quando é que compra um automóvel? Ele respondeu: mas eu já tenho 5 automóveis, a estudar no Porto...!
Certo é que todos sem excepção aproveitaram a oportunidade e em breve apanhava com 1 Doutor (de leis) e 4 Engenheiros (um civil, dois electrotécnicos e um mecânico). Nesta homenagem ao Avô Alfredo, gostava ainda de lembrar uma curiosidade: formou-se com a bonita idade de 22 anos – fazendo dois em um - Electrotecnia e Mecânica; que sirva de incentivo para os mais novos: Querer é poder!
AMOR À FAMÍLIA 
Teve a sorte de ter uma grande família que adorava. De uma forma geral arranjava sempre tempo para os seus irmãos, primos e demais familiares e amigos. Só quando esteve muito ocupado a servir o País é que esteve menos presente.
Organizador nato, de viagem por Portugal com os filhos que aprenderam o gosto de viajar, e mais tarde acompanhavam nas viagens para participar em reuniões, congressos e vôos inaugurais. Muitos Natais foram passados no Porto em casa da irmã – a nossa Tia Cláudia.
Quando chegava a casa era um verdadeiro festival. E então a abertura das malas – era qualquer coisa de sensacional – presentes inesperados, que não existiam em lado nenhum ... mas depois apareciam!

CONVICÇÕES RELIGIOSAS 
Foi um católico convicto, participou em diversos encontros e retiros religiosos, tendo sempre Cristo presente na sua vida, quer familiar, quer profissional. Teve ajudas, claro: primeiro a educação que recebeu dos pais e mais tarde o apoio da sua mulher Luísa, senhora de fé inabalável. Costumava dizer: a Fé move montanhas. Como graça, os nossos pais conheceram-se num baptizado em Viseu. Seis meses depois casaram. 
O nosso pai (avô Alfredo) deu sempre testemunho de Cristo nos actos públicos que promoveu. Alguns exemplos simples:
  • Recebido pelo Papa Pio XII para apresentação e benção da maqueta da Capela do Arcanjo São Gabriel, patrono das comunicações (capela a ser construída pela Marconi em Vendas Novas); nesta deslocação a Roma foi acompanhado pelo Primo Manuel Pinto de Mascarenhas, também administrador da Marconi e pelo Embaixador na Santa Sé.
  • Organizou a vinda a Fátima do Papa Paulo VI, tendo-se deslocado a Roma para acompanhar o Santo Padre nas viagens de Roma a Monte Real, num avião da TAP.
  • Nas viagens que organizava na TAP, em vôos inaugurais divulgando o País e a sua História, nunca foi esquecida a parte religiosa, com a benção dos aviões e através de missas celebradas pelo Capelão da TAP, assinalando a chegada dos portugueses a diversas partes do mundo: principalmente em África e na América do Sul (Brasil).
PRINCÍPIOS DE VIDA
Tinha sobretudo princípios muito fortes que aplicava constantemente, e em quaisquer circunstâncias da sua vida pessoal e profissional. Teve uma vida cheia de sucessos, mas também alguns dissabores, que tratava com igual atitude, num sábio equilíbrio que a todos nós transmitiu.
CURIOSIDADE E SEDE 
DE CONHECIMENTO
De entre as muitas qualidades do nosso pai, gostaria de realçar a sua enorme curiosidade, no sentido de aprender mais, de adquirir mais conhecimentos. Não da bisbilhotice dos dias de hoje. Nós achávamos que ele era enciclopédico! Mas ele dizia sempre: “Aprender até morrer”. Aqui ficam alguns exemplos:
  • Era uma pessoa muito inovadora, e por todo o lado por onde passava trazia sempre as últimas novidades. Na família, entre os irmãos, foi o primeiro a usar o pijama. Dormia-se na altura com umas camisas muito largueironas e havia até quem dormisse com uns barretes na cabeça – se calhar por causa do frio no Inverno.
  • Trouxe para o Estoril o primeiro barco de borracha que foi um sucesso. Da África do Sul veio um casal de pinguins para os filhos. Os nossos pais quando foram à Argentina trouxeram uma pequena charrette que fez as delícias do Zé Maria na altura com 5 anos – toda a gente parava na rua para o ver passar muito convencido da sua minúscula pessoa.
  • A primeira máquina de filmar tem a idade do Alfredo; ainda hoje podemos ver os filmes que ele fazia nessa época – há quantos anos? Uns 76. E esta hein?
  • Uma vez, em Nova Iorque, numa viagem com as nossas manas nos anos sessenta, foram dar uma passeio de barco à ilha de Manhattan, indo para o cais de autocarro. Quando entraram, o autocarro estava quase vazio, e o pai em vez de se sentar conosco, foi falar com o motorista para que ele lhe explicasse como funcionava o sistema de cobrança de bilhetes. Cá em Portugal, havia na altura a cobrança pelo chamado revisor ou na gíria o “pica”. Se ele estivesse na CP ou na Carris, logo teria posto em prática a medida. Foram precisos uns vinte anos para que essa “modernice” chegasse a Portugal.
INTELIGÊNCIA E HUMILDADE 
Inteligente, organizado, com uma visão alargada e perspectivando sempre o futuro, imprimia uma dinâmica especial à sua volta – um verdadeiro líder. Austero, mas tolerante, simples, justo e solidário, era apreciado por todos os que com ele contactavam, a nível profissional e familiar, colaboradores e amigos, desde os mais ilustres aos mais humildes, a todos tratava por igual, com a sua afabilidade, rigor e alguma boa disposição. Por vezes não era para brincadeiras ... “olha lá, menino!” ... era uma expressão frequente, que depois também usava para descontrair.
UMA VIDA DE TRABALHO
Depois de tirado o curso, esteve 3 anos sem arranjar trabalho; sem ficar de braços cruzados, começou a estudar profundamente o inglês, pensando emigrar para os Estados Unidos, onde surgiu uma hipótese de trabalhar numa petrolífera. Foi entretanto contactado por um professor conhecido para trabalhar com o Ministro do Comércio e das Comunicações da época – Dr. Antunes Guimarães. Aceitou de imediato, pois sabia que seria muito difícil para ele sair de Portugal, em especial por causa dos pais. Começou assim a trabalhar em Lisboa em 1930 como secretário do Ministro do Comércio e das Comunicações.
A partir daqui foi sempre um trabalhador incansável, dotado de um notável sentido de serviço público, demonstrado em diversos sítios:
  • em 1932 Inspector dos Armazéns Gerais Industriais;
  • entre 1933 e 1937 administrador-adjunto dos Correios com o pelouro internacional;
  • em 1937 administrador-delegado da Companhia Portuguesa Rádio Marconi, sendo eleito Presidente em 1941, onde ficou até 1967;
  • Presidente da Junta de Turismo da Costa do Sol entre 1952 e 1956;
  • de 1957 a 1973 Presidente da TAP;
  • entre 1968 e 1970 Ministro de Estado Adjunto do Presidente do Conselho;
  • de 1973 a 1974 Presidente da Shell Portuguesa, e presidente da Assembleia-Geral até 1976.
SOLIDARIEDADE SOCIAL
A firme convicção de solidariedade social, deixou marcas permanentes nas empresas por onde passou, designadamente através das regalias que criou para os trabalhadores, muito antes do tempo em que, muitos anos mais tarde, viriam a constituir parte da legislação portuguesa:
  • Criação dos Serviços Clínicos da Marconi em 1940, com consultas, análises e tratamentos grátis, e acesso aos remédios com descontos;
  • Instituiu subsídios de presente de baptizado e de casamento, e ainda subsídio de aleitação;
  • Iniciou a distribuição de resultados pelos trabalhadores, o que em 1956 ficou consagrado nos estatutos da Marconi;
  • Nesse mesmo ano de 1956 – há mais de 60 anos – foi criado o Subsídio de Lar atribuído aos funcionários cujas mulheres não trabalhassem;
  • Foi-lhe atribuída em 1959 pelos accionistas da Marconi, uma avultada quantia pelos serviços prestados ao longo de 21 anos. Escusando-se a ficar com ela, criou o Fundo de Reformas dos Trabalhadores da Marconi.
O BEM PÚBLICO 
A permanente preocupação pelo bem público, é bem testemunhada pela dedicação que ofereceu durante 4 anos na Junta de Turismo da Costa do Sol, onde dinamizou diversas iniciativas de reconhecido mérito, com por exemplo o Diploma do Cabo da Roca (ponto mais ocidental da Europa), o inventário das riquezas arqueológicas e históricas da zona, a instalação no Estoril de aparelhos para medir a poluição atmosférica e o aproveitamento turístico de eventos sociais, como o casamento da Princesa Maria Pia de Sabóia, com brochuras de fotografias vendidas para angariar fundos destinados a construir casas para famílias pobres.
ALGUMAS DAS CONDECORAÇÕES
Em Junho de 1967, foi-lhe concedida por Sua Santidade o Papa Paulo VI
  • Comenda com placa de São Gregório Magno
Foi agraciado pelo Presidente da República
  • Grande Oficial da Ordem de Mérito Agrícola e Industrial, 1964
  • Grande Oficial da Ordem do Infante Dom Henrique, 1967
Foi-lhe concedido o título pelo Governo Brasileiro:
  • Grande Oficial do Cruzeiro do Sul, 1967
Diversos títulos de cidadania:
  • Cidadão Paulistano, Setembro de 1963
  • Cidadão do Estado de Guanabara, Novembro de 1964
  • Cidadão de Pernambuco, Abril de 1967
  • Cidadão de Belmonte, em 1967
Foi distinguido, pelo SKAL Clube de Lisboa, Prémio SKAL 1966.
UM HOMEM HONESTO
O nosso pai era um Homem extremamente honesto, escrupuloso e rigoroso. Uma pequena história dá para perceber o seu caracter – convidado para Ministro, estava na altura na TAP e na Marconi, e detinha uma carteira de acções das duas empresas, que vendeu para que qualquer proposta relativa a alguma das empresas, não pudesse vir a reverter em benefício próprio.
O seu espírito de sacrifício e dedicação à causa pública eram notórios e o lucro pessoal estava arredado do seu espírito. Foi um verdadeiro patriota.
Que saudades, e que falta faz a Portugal ...

TEXTO ESCRITO POR: 
José Vaz Pinto por ocasião do centenário do Eng.º Vaz Pinto

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